Num relatório hoje publicado, intitulado “A jogar um jogo perigoso? Riscos em matéria de direitos humanos relacionados com os Mundiais de 2030 e 2034”, em tradução livre, a AI dá conta das responsabilidades da FIFA e dos organizadores para evitar a repetição dos “abusos” verificados no Qatar, aquando do Mundial2022.
Além das notas deixadas a Portugal, Espanha e Marrocos, organizadores em 2030, as críticas e exigências sobem de tom quanto ao Estado saudita.
“A Arábia Saudita tem um historial aterrador em matéria de direitos humanos e a sua candidatura acarreta múltiplos riscos. […] Existe um projeto do código penal que poderá consagrar na lei muitas das violações dos direitos humanos”, pode ler-se no resumo que acompanha o relatório.
De resto, a AI lembra a “campanha de reabilitação da imagem”, assente no investimento de milhares de milhões de euros no desporto, com o futebol à cabeça, que levou ‘astros’ como Cristiano Ronaldo para aquele país, para “desviar a atenção do seu grave registo de abusos”.
“A organização do Mundial em 2034 exigiria um enorme programa de construção, aumentando os riscos relacionados com os desalojamentos forçados, que já ocorreram com projetos de construção existentes. Há relatos de utilização de força letal para desmantelar povoações no âmbito da The Line, parte do projeto de construção da cidade NEOM”, denuncia esta organização.
Os riscos associados aos trabalhadores, prevendo-se a necessidade de centenas de milhares de profissionais, a maioria dos quais migrantes, são consideráveis e, em parte, semelhantes aos que foram descritos quanto ao Qatar, organizador do torneio de 2022.
Um desses casos é o do sistema de ‘kafala’, “que estabelece uma ligação legal a partir do estatuto de imigrante de um trabalhador com um empregador ou patrocinador”, deixando as pessoas vulneráveis a fraude salarial, violência e outros abusos.
A discriminação “profundamente enraizada na legislação” pode afetar adeptos, jogadores, jornalistas e trabalhadores, com as mulheres especialmente suscetíveis, bem como as pessoas LGBTQIA+
“Qualquer prática pública de outra religião que não seja o Islão é proibida e a minoria muçulmana xiita enfrenta discriminação acrescida. […] A liberdade de expressão, de associação e de reunião pacífica é reduzida ou inexistente”, denuncia.
Estão proibidas as organizações de defesa dos direitos humanos, partidos políticos, sindicatos e o jornalismo é altamente controlado, com detenções generalizadas, com a AI a lembrar o assassinato e desmembramento do jornalista Jamal Khashoggi, crítico do regime saudita, no consulado daquele país na Turquia, em 2018.
“Os cidadãos estrangeiros representaram 39% das pessoas executadas em território saudita entre 2010 e 2021, mesmo por infrações não violentas, como acusações de tráfico de droga. A Amnistia Internacional registou a execução de 172 pessoas pela Arábia Saudita em 2023, de pelo menos 13 países diferentes, entre as quais seis mulheres”, lembra.
O relatório lembra que a FIFA deve decidir não atribuir o Campeonato do Mundo se o país organizador não conseguir garantir o cumprimento dos direitos humanos, rescindindo quaisquer acordos se estes forem violados, pedindo ao organismo de cúpula do futebol mundial que exija alterações profundas na legislação saudita.